domingo, 16 de agosto de 2015

POR QUE LULA NÃO ACEITOU SER MINISTRO DE DILMA

Por Ricardo Amaral
Ao recusar um posto no ministério da presidenta Dilma Rousseff, o ex-presidente Lula produziu um raro momento de grandeza na cena política brasileira. Lula considera indigno de sua história buscar, no foro privilegiado, o salvo-conduto contra as arbitrariedades da hora. Virar ministro seria criar um constrangimento para o governo e para a presidenta. E isso Lula não fará jamais. É assim que se comporta um líder, que não precisa de cargos para exercer a política e dispensa refúgio para a dignidade afrontada.
Na plena vigência do estado de direito, Lula não teria nada a temer. Não cometeu nenhum crime, antes, durante ou depois de governar o País. Sua atividade como palestrante é o resultado da projeção internacional que conquistou. Recolhe impostos pelo que ganha licitamente. Não faz lobby, consultoria nem intermediação de negócios. O Instituto Lula não recebe dinheiro público, nem direta nem indiretamente. Mas, e daí?
No ambiente de terror policial insuflado pela oposição e pela mídia, Lula tornou-se alvo de toda sorte de violência. Agentes do terror lançaram uma bomba na sede do Instituto Lula. Agentes do Estado, que deveriam estar submetidos à Lei e à hierarquia, quebraram ilegalmente o sigilo bancário do ex-presidente e de um de seus filhos. As pegadas sujas do crime estão nas páginas de uma revista sórdida esta semana. Quebraram o sigilo de suas comunicações e, ao invés de denunciá-la, parte da imprensa associou-se à meganha bandida.
Há fortes motivos para crer que o próximo passo seja submeter Lula aos métodos parajudiciais da República de Curitiba: o mandado cego de busca; a condução coercitiva para mero depoimento; a prisão "preventiva" pela simples razão de que o sujeito está solto. Os vazamentos seletivos dos últimos dias desmoralizaram as negativas formais do juiz e dos promotores da Lava Jato: Lula é, sim, o alvo cobiçado da operação. Não para ser processado, pois não há acusação contra ele, mas para ser humilhado diante das câmeras.
No estado de exceção a que se encontra sujeita uma parte do País, ninguém poderia negar razão a Lula caso aceitasse a oferta solidária e leal da presidenta Dilma. Ministro, ele estaria a salvo das arbitrariedades da primeira instância e do terror policial-midiático. Mas Lula não é um ex-presidente qualquer – e nisso é preciso concordar, por razões opostas, com o autor original da frase: Merval Pereira.
O imortal do Globo sustenta que Lula não pode ser tratado como um cidadão de pleno direito, porque continua sendo um líder muito influente cinco anos depois de ter deixado o Planalto. Trapaça da história: o promotor que denunciou Lula na LSN por um discurso contra a ditadura, em 1980, também sustentou que a ameaça à segurança nacional não estava exatamente nas palavras do metalúrgico, mas na influência que ele exercia sobre as plateias.
De volta ao imortal: Lula não pode fazer palestras para empresas contratadas pelo governo (Merval talvez ignore que seu patrão, o Infoglobo, que tem contratos milionários com o governo, já contratou palestra de Lula). O Instituto Lula não pode receber doações empresariais (só o Instituto FHC pode, e pode até receber doação da estatal tucana Sabesp). Lula não pode encontrar governantes estrangeiros (embora seja o brasileiro mais respeitado ao redor do mundo). E, se isso fosse possível, Lula não poderia fazer política.
Este raciocínio autoritário, parcial e preconceituoso sustenta as torpezas cometidas contra Lula (e contra a verdade) pelos veículos e colunistas amestrados sob influência do sublacerdismo tosco e tardio que emana da rua Irineu Marinho. É o que explica as manchetes mentirosas atribuindo a Lula a propriedade de um apartamento que ele não tem, os "voos sigilosos" (em aviões invisíveis?), as "reuniões secretas" (em auditórios públicos, com cobertura da imprensa), os telegramas oficiais grosseiramente manipulados para virar notícia.
Lula é atacado justamente por ser o mais influente líder popular que o Brasil já conheceu. E por ser o maior obstáculo ao projeto regressista e conversador que, frustrada a aventura golpista, por suas contradições políticas e econômicas, precisa eliminar a liderança de Lula antes das eleições de 2018. A Pax Marinho, que ninguém se engane, é um movimento das elites econômicas para garantir a estabilidade necessária ao ambiente de negócios. Não é um pacto para preservar Dilma. E muito menos, para preservar Lula.
O que preserva Lula é sua liderança, sua coerência e seu caráter. Ao recusar o ministério, Lula promoveu um magnífico contraste com personagens políticos, institucionais e midiáticos nesta que é a mais rebaixada quadra da disputa política desde a redemocratização. Enquanto alguns ousam sequestrar instituições, para salvar a pele ou perseguir adversários, e outros se omitem de suas responsabilidades republicanas, por covardia ou conveniência, Lula decidiu simplesmente portar-se com dignidade.
A recusa de Lula é um gesto fundamentalmente moral. É corajoso, porque arrosta a arbitrariedade, e desprendido, porque preserva a presidenta. É mais uma lição do ex-retirante, ex-engraxate, ex-metalúrgico, ex-sindicalista para a educação política desta e de outras gerações. Isso é incompreensível para os abutres que tentam medi-lo pela régua de seu próprio e mesquinho caráter. Lula não é mesmo um ex-presidente qualquer. Lula é um líder.

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Marcha das Margaridas e o silêncio da Globo

 Com mais de 70 mil mulheres reunidas em marcha, a defesa da democracia foi uma das pautas da Marcha das Margaridas, além de manifestações de apoio à presidenta Dilma Rousseff. 
Por MARIANA TRIPODE

Fechando mais de seis faixas na avenida no sentido do Congresso, e com uma abertura que seguiu ao ritmo dos vários gritos de mulheres do campo, da floresta e das águas, que mostraram que os ideais de Margarida Alves continuam vivos, mesmo depois dos 33 anos de seu brutal assassinato e o repasse das emissoras ao público brasileiro só poderia ser visto, caso os telespectadores não piscassem os olhos.
A Marcha floriu Brasília. A Marcha é pela dignidade Feminina. A Marcha é por mulheres que vivem escondidas em seus cantinhos e que sofrem a exploração do poder masculino e do machismo a cada dia. A Marcha é pelas mulheres negras, e a Marcha dessas mulheres guerreiras tornou-se apoio decisivo à Presidenta Dilma e ao ex-presidente Lula.
Uma manifestação linda de se ver, que defende direitos sociais e a democracia.
As Margaridas estão nas ruas levando a voz de todo o Brasil, a voz de todas as mulheres, não só do campo, mas das cidades, dos becos, das comunidades, das periferias, das escolas. Em defesa da não redução de direitos da classe trabalhadora, elas estão, acima de tudo, defendendo a igualdade de gênero, um país mais justo, soberano e igualitário entre homens e mulheres.
Representantes do movimento se deslocaram de seus estados no último sábado. Do Acre, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, São Paulo, Goiás, enfim, estados de todo o Brasil. Algumas levaram mais de 40 horas para chegar a Brasília.
A indignação não somente minha, mas de várias mulheres, toma conta de nossos corações, porque uma manifestação que foi potencializada pela histeria midiática dos últimos dias e que levou mulheres nuas às ruas aos gritos de "Fora Dilma, Fora PT, quero um País melhor, sem corrupção" foi reproduzida pela emissora a cada piscada de olho dos telespectadores.
E qual seria a razão da TV Globo ao não mostrar a Marcha das Margaridas em apoio à presidenta Dilma? Será por que não havia mulher pelada? Censuraram o bom senso?
Todo esse processo culmina com a manifestação de nossa dignidade histórica, nossa condição social, nosso grito de luta para que a sociedade não mais silencie diante da exploração, dos modelos de poder que são impostos a nós mulheres, em todas as frentes em que atuamos.
E que principalmente, aqueles que fingem ou negam ver essa força política, saibam que estamos nas ruas, nas casas, nas escolas, nos bairros, nas igrejas, nas favelas, nas praças, nos parlamentos, nos nossos trabalhos e não nos cansaremos mais, nem seremos caladas.