quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Reforma política: conservadores insistem em argumentos falsos

Quando se referem à reforma política, os conservadores, e os tucanos em particular, para manter as aparências, referem-se à necessidade de fortalecer os partidos políticos.

Uma ponta deste véu foi levantada nesta quarta feira (dia 23) por um cardeal tucano e ex-secretário geral da Presidência da República sob Fernando Henrique Cardoso, Eduardo Graeff, que, num artigo publicado em O Estado de S. Paulo, verbera contra o voto em lista, uma das medidas em estudo entre os parlamentares.

O argumento dele é claro e direto: o voto em lista é inaceitável porque favorece o PT – e os partidos progressistas e de esquerda, poderia acrescentar. Mesmo porque, como reconhece, com ele a oposição conservadora e neoliberal “corre um enorme risco de ser tratorada”.

Este texto merece menção justamente por deixar claro o objetivo da oposição conservadora: não é do fortalecimento dos partidos que se trata, mas sim da saúde eleitoral de suas próprias combalidas agremiações e de estabelecer diques contra o avanço dos partidos patrióticos, democráticos e populares.

Neste afã, os tucanos – e, naturalmente, Graeff – apegam-se também a uma velharia que já foi experimentada e condenada desde as eleições dos tempos do Império: o voto distrital.

Esta experiência eleitoral nefasta já foi feita no Brasil sob o regime da lei de 19 de setembro de 1855, que estabelecia “círculos” (distritos) de um deputado. Como hoje, um dos argumentos era a necessidade de aproximar o deputado dos seus eleitores. O resultado foi um desastre registrado por um cronista de então, Francisco Belisário Soares de Souza: a Câmara dos Deputados se transformou em refúgio de notabilidades de aldeia. “Os interesses locais invadem de modo assustador; os grandes interesses da Pátria são esquecidos”, escreveu aquele observador atento.

O Brasil só alcançou um sistema eleitoral estável com o Código Eleitoral de 1932, que entre outras coisas introduziu o voto proporcional, um avanço que a própria ditadura militar de 1964 não teve condições de eliminar, apesar de todos os atentados que cometeu para fraudar a vontade manifestada pelo eleitor nas urnas.

Na terça feira, dia 22, a instalação, no Senado, da Comissão da Reforma Política reintroduziu o tema na pauta legislativa, acompanhada da forte esperança de existirem, agora, condições para avançar nas mudanças necessárias. A lista de temas é extensa e inclui desde o sistema eleitoral até o financiamento de campanhas, coligações partidárias, fidelidade partidária, voto facultativo e reeleição.

O debate sobre as regras eleitorais é, visto de perto, uma disputa sobre a distribuição e o funcionamento do poder político no país. Os conservadores preconizam regras para engessar e amesquinhar a representação parlamentar dos interesses democráticos, populares e avançados. Na outra ponta, querem fortalecer sua própria representação, mesmo tendo, nas urnas, votos cada vez mais escassos. Propostas antediluvianas como voto distrital, “distritão”, oposição ao voto em lista e ao financiamento público de campanha, cláusula de barreira para o funcionamento dos partidos, proibição de coligações em eleições proporcionais, fazem parte do arsenal para falsificar a vontade do eleitor e limitar a representação popular.

A reforma política necessária tem outro formato. Ela precisa garantir a ampliação do protagonismo popular, fortalecer realmente os partidos (daí a exigência do voto em lista que significa, na verdade, a escolha da proposta programática apresentada por um partido, e do financiamento público de campanha para criminalizar a escandalosa influência do poder econômico nas eleições).

Uma reforma política democrática precisa garantir também a ampla liberdade de alianças partidárias, a manutenção do voto proporcional e o respeito escrupuloso aos percentuais de representação alcançados nas urnas pelos partidos.

Este foi o sentido da manifestação da senadora comunista Vanessa Grazziotin (PCdoB-Amazonas) na instalação da Comissão do Senado: “Nós defendemos o voto em lista e a fidelidade partidária”.

O avanço e a consolidação da democracia depende de uma reforma política democrática que assegure, fortaleça e amplie a participação popular nas decisões. O resto são velharias já experimentadas e condenadas que os conservadores, saudosistas de um passado de mando quase ilimitado, teimam em defender com argumentos surrados e falsos.

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